1.
EDUCAÇÃO
CONTÍNUA DE ADULTOS NO CONTEXTO DA SOCIEDADE
1.1.Conceitos
da educação e da alfabetização
Educação e Cultura
Para Pinto(2010), A
educação é a formação do homem pela sociedade em que está inserida, ou seja, é
o processo onde a sociedade integra o indivíduo em seu modo de ser social,
buscando sua aceitação para actuar em fins colectivos e não individuais. Nessa
perspectiva, “a educação é o processo pelo qual a sociedade forma seus membros
à sua imagem e em função de seus interesses.Na sociedade, a educação se
apresenta como um meio de reprodução da cultura, pois a cultura inclui todos os
aspectos, segundo os moldes e pelos meios que uma cultura existente
possibilita.
1.1.2. História
da Alfabetização em Moçambique
Mário (2002) identifica três etapas distintas na provisão
de programas de alfabetização e educação de adultos em Moçambique. A 1ª etapa começa em 1975, após a
proclamação da independência nacional, e estende-se até meados da década de 80.
Tem como marco de referência a consagração da Educação de Adultos como um dos
pilares do Sistema Nacional de Educação.
A 2ª etapa tem
início nos meados da década de 80, e prolonga-se até 1995. Ela é caracterizada
por uma redução significativa das actividades de alfabetização e educação de
adultos devido à intensificação da guerra de desestabilização então movida pelo
regime do “apartheid” da África do Sul. Para além da destruição de infra-estruturas
e perda de vidas humanas, a guerra esteve na origem directa do afluxo de
milhares de refugiados moçambicanos nos países vizinhos e de milhões de
deslocados em todo o país. Assim, a alfabetização e educação de adultos
passaram a estar confinadas às grandes cidades.
A 3ª e última
etapacomeça em 1995 e estende-se até aos nossos dias. Ela pode ser
caracterizada como um processo de redescoberta e o resgate da alfabetização e
educação de adultos, no contexto de paz e estabilidade social que o país
vive, e como instrumento indispensável de um desenvolvimento económico e social
sustentável, centrado no homem e na mulher moçambicanos.
Para Moraisetal.,(2010), a alfabetização consiste
na acção de alfabetizar, de ensinar crianças, jovens ou adultos a ler e
escrever.
Já para Schwartz (2010),
no sentido etimológico, alfabetizar significa levar a aquisição do alfabeto, o
que deixa o termo reduzido a uma estratégia mecânica, articulada com a
habilidade de codificar e descodificar grafemas e fonemas. Ela ainda diz que “o
conceito de alfabetização se refere a habilidade de ler e escrever.
Para Haddad (2007)apud Paiva etal., (2014), dizem que a educação contínua é aquela que se
realiza ao longo da vida,
continuamente, é inerente ao desenvolvimento da pessoa humana e relaciona-se
com a ideia de construção do ser. Abrange, a aquisição de conhecimentos e
aptidões por um lado, e do outro lado, as atitudes e valores, implicando no
aumento da capacidade de discernir (apreciar algo) e agir. Essa noção de
educação envolve todos os universos da experiência humana, além dos sistemas
escolares ou programas de educação não formal.
Os autores sustentam ainda que, aeducação ao longo da vida,também é
considerada pelo Parecer CNE/ CEB n. 11/2000 (p. 11), ao anunciar a função qualificadora
da EJA (Educação de Jovens e Adultos): capaz de propiciar a todos a
actualização de conhecimentos por toda a vida, e ainda reforçando que tem como
base o carácter incompleto do ser humano cujo potencial de desenvolvimento e de
adequação pode se actualizar em quadros escolares.
É neste contexto que, segundo Torres (2003)apud Nanja (2002), fala que, a
aprendizagem de adultos acontece com várias intenções (alfabetização,
desenvolvimento profissional, diversão, desenvolvimento das comunidades), sob
várias abordagens (formal, não formal e informal), em vários lugares (sob uma
árvore, numa escola, nos campos agrícolas, nas igrejas, nos teatros, e mais
lugares) e ao longo da vida adulta (15 anos para diante).
Contudo, é importante
ressaltar que a educação se multiplica com sua própria realização. Quanto mais
o homem é educado, mais ele sente a necessidade da educação. Como já se referiu
que a educação nunca é acabada, quanto mais a se tem, mais a queremos. Ela é
intencional. Quando o homem se sente inacabado, necessita adquirir novos
conhecimentos, então, é através da educação que o homem consegue suaauto
consciência, se insere cada vez mais na sua cultura social e adquire novos
conhecimentos.
1.2.As
funções da educação de adultos
A função da educação de jovens e adultos é levar o
indivíduo a reconhecer os direitos civis no meio social. De acordo com as
directrizes curriculares nacionais, a EJA está dividida em três funções da
modalidade de ensino: a função reparadora, função equalizador e função
qualificadora.
i)
A
Função reparadora, é aquela que não admite que os jovens e
adultos sejam negados o direito civil, o direito a uma escola de qualidade, o
reconhecimento à igualdade, sendo que esta educação é muito importante para os
adolescentes e adultos se sentir mais seguros para enfrentar os desafios que o
mundo oferece ao indivíduo.
Para que isso possa acontecer é preciso que criem um
modelo educacional que leve tais alunos a reflectirem sobre o seu direito de
estudar outorgado por lei em uma escola de qualidade.
ii)
A
Função equalizador, constitui aquela que oferece novas
oportunidades, dando mais direito ao indivíduo, novos caminhos ao mundo do
trabalho e na vida social de cada um. A EJA é apresentada pela sociedade
como uma busca da igualdade, que se dá pela possibilidade de efectivar um
desenvolvimento a todas as pessoas de todas as idades.
Essa função, autoriza adolescente e adulto a lutar
por um conhecimento que mostre a capacidade de troca de experiências e
passa a conhecer novas técnicas de trabalho e cultura.
iii)
A
Função qualificadora, é uma educação que permite um
desenvolvimento potencial de carácter, podendo ser enquadrado no currículo
escolar ou não. Mas, a educação de jovens deve ser sempre uma educação
qualificadora que é de qualidade, que não fica só no que existe, mas que está
sempre apresentando algo novo, uma educação que faz a diferença.
Contudo, as palavras que compõem a função da EJA, cobra
dos gestores, o direito a uma escola de qualidade, o reconhecimento a
igualdade, novas oportunidades, novos caminhos ao mundo do trabalho no contexto
de uma educação qualificadora que não fica estagnada no mesmo lugar mas, que
acompanha os avanços das ciências e da tecnologia, tendo o cuidado de
multiplicar o conhecimento, mas para especialmente os homens que pensam (CURY
& AUGUSTO).
1.3.Métodos
alternativos da educação de adultos
A Educação de Jovens e Adultos exige do educador uma
metodologia diferenciada de outras modalidades de ensino, bem como uma relação
afectiva entre professor/aluno. Para Libâneo (1992), o trabalho docente
constitui o exercício profissional do professor e este é o seu primeiro
compromisso com a sociedade. Sua responsabilidade é preparar os alunos para se
tornarem cidadãos activos e participantes na família, no trabalho, nas
associações de classe, na vida cultural e política.
Neste contexto, o educador da EJA deve estar preparado
para a diversidade existente na sala de aula as diferenças de comportamento e
de necessidades de jovens e adultos, pois, uma prática usada com um jovem pode
não facilitar a aprendizagem de um adulto, dessa forma o professor deve ser
flexível e saber trabalhar com essas diferenças.
O professor precisa estar atento a sua prática educativa,
é necessário deixar de lado na sua prática pedagógica métodos de ensino
infantilizados dando espaço para o diálogo, exposição de ideias, pontos de
vistas, enfim, garantir que o aluno desenvolva o processo de democratização e
cidadania de educação para EJA (SILVA & ARAÚJO, 2016).
Para Freire (1996), o fundamental é que o professor e
alunos saibam que a postura deles, do professor e dos alunos, é dialógica,
aberta, curiosa, indagadora e não apassivada, enquanto fala ou enquanto ouve. O
que importa é que professor e alunos se assumam epistemologicamente curiosos.
Neste sentido, o bom professor é o que consegue, enquanto fala trazer o aluno
até a intimidade do movimento de seu pensamento. Sua aula é assim um desafio e
não uma “cantiga de ninar”. Seus alunos cansam, não dormem. Cansam porque
acompanham as idas e vindas de seu pensamento, surpreendem suas pausas, suas dúvidas,
suas incertezas.
1.4.Políticas
sociais da educação contínua de adultos
Mário & Nanja (2006 p.10) A
alfabetização e educação básicas constam de vários instrumentos legais e de
políticas de desenvolvimento do país. Dentre eles se destacam: a Constituição
da República de Moçambique que define a educação como um direito de todo
cidadão (Artigo 88.o) e como um caminho para a unidade nacional, a erradicação
do analfabetismo, o domínio da ciência e da técnica, bem como a formação moral
e cívica dos cidadãos (Artigo 113.o); o Programa do Governo para 2000-2004, que
preconizava o relançamento da alfabetização, dando-lhe uma dimensão global e
realística, e que tinha como objectivo a redução do analfabetismo em 10%; a Lei
nº 6/92 que actualiza o Sistema Nacional de Educação - SNE em conformidade com
o novo modelo económico e político consagrado na Constituição de 1990; o Plano
de Acção para a Redução da Pobreza Absoluta, 2001-2005 – PARPA, que define a
alfabetização e a educação de adultos como um dos objectivos primordiais do
programa educacional; a Estratégia Nacional de Alfabetização e Educação de
Adultos e Educação Não-Formal (AEA/ENF), cujo objectivo principal é a
erradicação do analfabetismo no país, e o novo Programa do Governo 2005-2009
que retoma o objectivo de redução do analfabetismo em 10%. Todos os documentos
normativos e de políticos acabados de citar podem ser encarados como uma
manifestação da vontade do governo e da sociedade como um todo em conferir à
alfabetização um espaço e um papel cada vez mais activo na redução da pobreza e
no desenvolvimento do país, conformando-se, assim, com os compromissos
internacionais assumidos a partir das Declarações de Jomtien e de Dakar, entre
outros. Nestes últimos documentos a alfabetização é definida como “aprendizagem
da leitura, escrita e numeração, desenvolvidas de forma a utilizá-las
efectivamente para aprender a aprender e para satisfazer as necessidades
básicas”.A alfabetização é
considerada, por um lado, a aquisição de noções básicas de leitura, escrita e
cálculo e, por outro lado, um processo que estimula a participação nas
actividades sociais, políticas e económicas e permiteuma educação contínua e
permanente. O conceito adoptado reflecte, também, o tipo de alfabetização
funcional inserido como uma das actividades de desenvolvimento local.
1.5.Questões
para discutir sobre a educação de adultos em Moçambique
Apesar das iniciativas do governo viradas para a
correcção das disparidades em termos de acesso e retenção, a paridade de género
ainda continua longe de ser alcançada. O acesso e, principalmente, a retenção
da mulher e da rapariga em programas de alfabetização ainda registam níveis
relativamente baixos. Os dados disponíveis indicam, por exemplo, que, em 2002,
60% de ingressos no primeiro e segundo níveis correspondiam às mulheres,
enquanto que no terceiro nível, a percentagem era apenas de 48%. Entretanto, a
taxa de desistência posicionava-se em torno de 40%.
Existem actualmente dois grupos de provedores de
programas de alfabetização: o Governo e as organizações não-governamentais
(ONGs). Estas últimas podem ser tanto nacionais como internacionais. Operando em
espaços e horários diversos, fazem parte do amplo movimento de educação
não-formal na sociedade. Os programas desenvolvidos por ambos os grupos têm
tido como consequência o aumento, tanto do número de participantes como da
oferta de unidades de alfabetização. Dados do Ministério da Educação revelam
que em 2002 havia 259.435 adultos matriculados e, ao fim do primeiro nível, a
taxa de desistência era de 36% ao passo que a taxa de aprovação era de 76%.
Segundo Lind&Kristensen, em 2003 406.309 adultos estavam envolvidos em
programas de alfabetização.
Por outro lado, dados apresentados por Mário (2002)
indicam que, em 2001, havia 558 unidades de alfabetização e educação básica de
adultos no país. Já em 2004, estes números tinham aumentado de forma
significativa, estimando-se em 5.000 o número total de unidades existentes.
Um dos factores que poderá contribuir para a fraca
participação e os elevados índices de desistência dos programas de
alfabetização e educação de adultos em Moçambique é o facto de a grande maioria
da população, de origem Bantu, não dominar a língua portuguesa, a língua
oficial e de ensino do país. Com efeito, em 1997 apenas 40% da população
moçambicana sabiam ler e escrever em português. A maioria dos utentes da língua
portuguesa era do sexo masculino e residiam nas zonas urbanas. Atento a esta
situação, em 1991 o Governo Moçambicano decidiu introduzir um Programa de
Alfabetização em Línguas Moçambicanas, no âmbito do Projecto de Educação
Bilingue de Mulheres. Na fase inicial o projecto seleccionou duas línguas do
norte (emakhwae nyandja), duas do centro (senae ndau) e
uma do sul do país (changana).
Apesar de sucessivas declarações
de intenções por parte do Governo moçambicano de aumentar o financiamento dos
programas de alfabetização e educação de adultos, na prática os orçamentos
têm-se mantido inalterados nos últimos 5 anos. A título de exemplo, dados
recentes do Ministério da Educação e Cultura22 indicam que 4.1% do orçamento da
educação em 2003 se destinavam aos programas de educação de adultos. Porém,
informação colhida junto da Direcção Nacional de Alfabetização e Educação de
Adultos revela que, naquele ano, apenas 1% do orçamento da educação fora
alocado ao subsector de educação de adultos.
Em suma, apesar dos esforços do governo moçambicano e da sociedade civil, consubstanciados nos sucessivos planos quinquenais de 1995-1999 e 2000-2004, onde a alfabetização e a educação de adultos emergem como uma prioridade, as taxas de analfabetismo continuam elevadas e acima da taxa média dos países da África Sub-Sahariana. O sistema formal de ensino não consegue absorver todas as crianças em idade escolar, deixando de fora cerca de 50% das crianças, o que constitui uma fonte permanente de crescimento da população analfabeta no país.
REFERÊNCIAS
BIBLIOGRÁFICAS
SCHWARTZ, Suzana. Alfabetização
de jovens e adultos: teoria e prática. Rio de Janeiro. Editora Vozes, 2010.
Paiva etal.,Educação Continuada, Qualidade e Diversidade; 2014.
Para Telma Ferraz Leal,
Eliane Borges de Albuquerque e Artur Gomes de Morais (2010, p.15),
CURY, Augusto Jorge, desenvolvimentoprodutivo em Moçambique,2001.
MÁRIO, Mouzinho;NANDJA, Débora AAlfabetização em Moçambique.
C.P. 257 Maputo, Moçambique; 2006.
LIBÂNEO, José Carlos. Didáctica.
São Paulo: Cortez, 1992.
FREIRE, Paulo,Pedagogia
da Autonomia,ed. 25
São Paulo: Paz e Terra, 1996.
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